O
poeta, escritor e teatrólogo maranhense Ferreira Gullar morreu na manhã deste
domingo (4) no Rio, aos 86 anos. Gullar é um dos maiores autores brasileiros do
século 20 e foi eleito "imortal" da Academia Brasileira de
Letras (ABL) em 2014, tornando-se o sétimo ocupante da cadeira nº 37.
De
acordo com a ABL, Gullar foi vítima de uma pneumonia. Ele estava internado há
20 dias no hospital Copa D'Or, na Zona Sul do Rio.
O corpo
do escritor foi transportado ontem à Biblioteca Nacional, no Centro do Rio.
Hoje (5), ele sai para o velório no prédio da Academia Brasileira de Letras. Às
15h, o corpo será levado para o enterro no mausoléu da ABL, no Cemitério São
João Batista, no bairro de Botafogo.
Ferreira
Gullar deixa dois filhos, Luciana e Paulo, oito netos, e a companheira Cláudia,
com quem vivia atualmente. Seu último livro foi "Autobiografia poética e
outros textos", lançado este ano.
Quem era o poeta?
Às vésperas de morrer, consciente
da gravidade de seu estado, Gullar recusou a opção que lhe ofereceram de
prolongar sua vida artificialmente por meio de aparelhos. Respondeu que
preferia abreviar o seu fim. Impressionado com a decisão, o médico confessou
que nunca vira tanta coragem e lucidez assim. Essa vontade ele manifestou
também para sua filha Luciana, que o acompanhava no hospital .
A ela ele tentou
confortar argumentando que tivera uma vida muito digna e não queria prorrogá-la
sabendo que seria por pouco tempo.
Um de seus últimos apelos foi:
‘Luciana, tudo isso é inútil. Me leva para Ipanema. Quero entrar no mar e ir
embora’. Um final digno de figurar na literatura.
Quem era o poeta?
Poeta, crítico de arte, tradutor
e ensaísta. Ferreira Gullar era considerado um dos maiores poeta da literatura
brasileira. Um dos nomes mais importantes de nossas letras, José Ribamar
Ferreira iniciou sua carreira no ano de 1940, em São Luís, Maranhão, sua cidade
natal. Em 1951 transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde colaborou com diversas
publicações, entre elas revistas e jornais, além de ter participado ativamente
da criação do movimento neoconcreto.
A poesia de Ferreira Gullar
sempre destacou-se pelo engajamento político. Por meio da palavra, Gullar fez
da poesia um importante instrumento de denúncia social, especialmente na
produção dos anos de 1950, 1960 e 1990, haja vista que, posteriormente, o poeta
tenha reconsiderado antigos posicionamentos. Sua poética engajada ganhou força
a partir dos anos de 1960 quando, ao romper com a poesia de vanguarda, aderiu
ao Centro Popular de Cultura (CPC), grupo de intelectuais de esquerda criado em
1961, no Rio de Janeiro, cujo objetivo era defender o caráter coletivo e
didático da obra de arte, bem como o engajamento político do artista.Perseguido
pela ditadura militar, Ferreira Gullar exilou-se na Argentina durante os anos
de repressão, exílio provocado pelas fortes tensões psíquicas e ideológicas encontradas
em sua obra. A importância do poeta foi reconhecida tardiamente, na década de
1990, quando finalmente Gullar foi agraciado com os mais importantes prêmios
literários de nosso país.
Um dos poemas que virou música,
na voz de Fagner, Adriana Calcanhoto e tantos outros músicos:
Uma parte de mim é todo mundo:
outra parte é ninguém: fundo sem fundo.
Uma parte de mim é multidão:
outra parte estranheza e solidão.
outra parte é ninguém: fundo sem fundo.
Uma parte de mim é multidão:
outra parte estranheza e solidão.
Uma parte de mim pesa, pondera:
outra parte delira.
Uma parte de mim almoça e janta:
outra parte se espanta.
Uma parte de mim é permanente:
outra parte se sabe de repente.
Uma parte de mim é só vertigem:
outra parte, linguagem.
Traduzir-se uma parte na outra parte
– que é uma questão de vida ou morte –
será arte?
Nenhum comentário:
Postar um comentário